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Filantropia negra e justiça social no Brasil

Atualizado: 1 de nov. de 2023


Por Lavínia de Sousa Almeida Mendes


A presente escrita nasceu da busca por leituras sobre o agosto da filantropia negra em portais de artigos, dissertações e teses para download gratuito e os resultados levaram ao profundo silêncio acadêmico sobre filantropia negra e às produções autônomas das ONGs (Organizações Não Governamentais) e iniciativas sem fins lucrativos que compõem o Terceiro Setor.

Questionei por cá: Qual é o lugar e o não-lugar das organizações negras no Terceiro Setor, no investimento que visa projetos com impacto social e no universo da filantropia? Quais são as condições de trabalho especificamente das mulheres negras em permanecer no Terceiro Setor e não exercerem jornada dupla, tripla ou mais? Ainda mais, qual é o lugar destas discussões na academia?

Os primeiros contatos que tive com a noção de filantropia e especificamente a negra se deu a partir de 2022, quando passei por formação oferecida pelo edital Elas Periféricas, da Fundação Tide Setúbal, pelas Pretas de Angola - grupo fundado em 2015 por Érika Santos e Janira Sodré, aquilombando com Maria do Jardim em seguida. Na região metropolitana de Goiânia-GO, o grupo que hoje é composto por dez integrantes negras, tem por intuito impactar mulheres negras e a juventude negra em prol da defesa de direitos.

Em 2023, essas discussões se afunilaram ao participar do Programa Malunga, promovido pelo Fundo Agbara, representando a Colettiva Preta que:


(...) nasceu em 2022, a partir da experiência de realização durante o ano de 2021 das 6 edições da Feira das Pretas+, idealizada por Renata Caetano, o grupo aglutina gestoras, mulheres negras periféricas que atuam no fortalecimento e continuidade das iniciativas e empreendimentos liderados por mulheres negras, possibilitando a geração de renda, autonomia, empoderamento, enfrentamento a vulnerabilidade econômica e desenvolvendo ações de impacto socioambiental e cultural (COLETTIVA PRETA, SITE, 2023).


Os espaços de formação, orientação e compartilhamento de experiências entre organizações que são compostas por mulheres negras colaboram para o reconhecimento de nós mesmas como sujeitas produtoras de conhecimento, tecnologias sociais e vivências ancestrais.

 

¹ Licenciada em História (IFG) e especialista em Uso Educacional da Internet (UFLA). Compõe Conselho Fiscal da Associação Colettiva Preta, a coletiva Pretas de Angola e idealizou a Cria Gueto Cria. E-mail: lavmendes23@gmail.com; LinkedIn: https://www.linkedin.com/in/lav%C3%ADnia-de-sousa-almeida-mendes-700939226


Apesar de possuirmos segredos tão valiosos, próprios das nossas comunidades e do nosso axé, por que somos desvalorizadas e invisibilizadas como movimento, mesmo se propondo a defender e promover justiça, dignidade, acesso a direitos a outros, deveres do poder público.

Diante a pluralidade do setor, sua importância e este mercado como setor profissional, nos perguntamos onde está a filantropia negra? Com quais condições de trabalho? Com qual suporte financeiro anual para desenvolver suas atividades e remunerar os sujeitos envolvidos? E as mulheres negras conseguem viver de forma digna com seus ganhos no Terceiro Setor? Sobre isso, a pesquisa publicada pela Iniciativa Pipa indica que um número considerável de organizações negras sobrevive com até 5 mil reais por ano.

A filantropia para as organizações negras em muito se relaciona à construção coletiva de estratégias de sobrevivência, acesso a trabalho digno, promoção de justiça social e partilhar afro-afetos, ganhos e insucessos, almejando estourar bolhas de capital acumulado, bem como proporcionar o acesso a direitos por parte das comunidades periféricas.

Em busca de chamar a atenção das grandes organizações interessadas no Terceiro Setor, na filantropia e campanhas nacionais e internacionais de doação, os grupos e as lideranças negras pontuam a necessidade em descentralizar o investimento do sudeste, financiar iniciativas em processo de formalização, apoiar grupos periféricos e projetos que tenham como público majoritário as populações negras, as mulheres, os povos originários, a comunidade LGBTQIAPN+, causas como a ambiental e a economia criativa. Sobre a pauta etnicorracial pontua-se:


Segundo dados do Censo GIFE 2018, apenas 10% das organizações afirmam focar a população negra em seus programas e projetos de doação. Este percentual cai para 2% quando se trata de definir organizações que tenham a população negra, a equidade racial ou o combate ao racismo contra a população negra como foco prioritário (BAOBÁ, SITE, 2021).


Dessa forma, fica perceptível que promover igualdade racial ou ao menos a diminuição das desigualdades advindas do racismo nem sempre foram (e poderíamos dizer que já são?) prioridades do investimento social. A fim de propor posturas-outras e pluralizar as possibilidades de investimento para organizações negras que tenham objetivo de atender grupos não privilegiados, o primeiro Agosto da filantropia negra no Brasil ocorreu em 2021, dez anos após o início do mesmo nos Estados Unidos:


A filantropia e o investimento social são áreas estratégicas de fomento do debate sobre o enfrentamento ao racismo e fortalecimento da equidade racial. É nesse contexto que se celebra, durante todo o mês de agosto, o Black Philanthropy Month (MAPAOSC, SITE, 2022).


A filantropia ainda precisa de descolonizar e se compor de forma mais diversa, plural e dialogar com as bases. As organizações negras promovem mudanças em suas comunidades e buscam reconhecimento, investimento e patrocínio. Ao se depararem com o excesso de burocracia e descrédito, muitas se sustentam com recursos dos próprios integrantes e doações da população que atende.


Vamos transformar essa realidade?


 

Nós, da Iniciativa PIPA, acreditamos no “fazer junto”, por isso, disponibilizamos o BLOG DA PIPA para ser um espaço colaborativo e que se propõe a pensar as periferias por elas mesmas. E mais, queremos pensar e refletir sobre a relação entre as periferias e a filantropia, questionar porque os recursos não chegam e reverberar as resoluções que vem dos próprios territórios periféricos.


Acreditamos nos atravessamentos das realidades periféricas cotidianas que permeiam o Brasil de Norte a Sul e queremos contar essas histórias, emoções, dores e alegrias, porque a Periferia é Vida, com muitas dores, mas também, com muita risada, arte e saberes.


Então, se você tem um texto que reflete sobre os territórios periféricos, vem somar com esses conhecimentos diversos para juntos construirmos realidades potentes.


Envie seu texto e uma foto (do autor/a/e) para o e-mail: pipaacomunica@gmail.com

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