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Do outro lado do Rio

Atualizado: 1 de nov. de 2023

Hera Marques - Pesquisadora PIPA da região Sudeste


Quando falamos de Rio de Janeiro o que vem à mente da maioria das pessoas é samba, mulheres semi nuas e homens malandros sambando, carnaval, a praia de Copacabana, o Cristo e sabe-se lá quais clichês que a indústria do marketing vendeu sobre a cidade.

Acontece que eu parto de um outro Rio, um Rio que muitas vezes não é visto, exceto em capas de jornais ou na chamada de algum jornal das grandes emissoras noticiando alguma enchente ou pelos casos de violência.


Eu sou cria de Imbariê, 3º distrito do município de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, ou seja, no lado “não visto” do Rio. De acordo com o Índice de Desenvolvimento Humano, Imbariê tem um dos índices mais baixos do município de Duque de Caxias.


Dizem algumas fontes, que nos primórdios do bairro, quando quem habitava a região eram os indígenas tupis, que o batismo da região pelo nome de Imbariê se deu pelo fato da região ser bastante alagada com águas barrentas e consideradas sujas o que fazia com que dificultasse a habitação humana. Logo, Imbariê significa “água barrenta” em tupi.


Mesmo depois de séculos, a história não mudou muito. Imbariê ainda é assolada por grandes enchentes nas épocas de chuva. A qualidade da água também não é das melhores. Há uma brincadeira entre os moradores da região que nós não podemos ter roupas de cores claras, já que pela água ser bastante barrenta, sempre manchamos as nossas roupas.


Um fator que marca bastante o território é o acesso ao transporte. Nosso bairro é atendido pelo modelo de trem Maria Fumaça. Alguns carros são da década de 80 e os horários são com um intervalo de tempo enorme. Aos finais de semana, há apenas quatro horários disponíveis. Outra questão são os valores das passagens de ônibus, algumas linhas chegam a custar mais de $10,00. Por esta razão, os moradores daqui, como eu, acabam tendo direitos básicos como o acesso à água, ao transporte e até mesmo a cultura e educação negados.


Acredito que todos os motivos relatados anteriormente impactou o meu (des)envolvimento com a Pesquisa. Ao perceber todas as questões que atravessam o meu território, tive um olhar mais atento ao mapear os projetos e grupos. Busquei projetos que tivessem seu trabalho voltado à territórios localizados no lado B do Rio. Territórios estes esquecidos e marginalizados. Projetos estes que mesmo com tamanha atuação e relevância, estão de pé com muita garra, porém com pouco financiamento. O que chega a ser quase que um milagre, já que sua demanda é altíssima e a eficácia e atendimento espetacular, embora os recursos parcos.


Ao realizar a pesquisa seja de forma presencial ou remota, ficou claro a urgência de se pensar o acesso à recursos filantrópicos para projetos mais “à margem”, que não possuem registro formal ou, até mesmo, que seus líderes não tenham ciência de como acessar recursos financeiros para a manutenção e existência de seus projetos.


A Iniciativa PIPA, ao ser pensada por sujeitos que conhecem a realidade, sabem o que é produzir ações sem ou quase nenhuma verba, propõe intervenções efetivas ao se pensar o deslocamento do debate do meio do olhar branco e erudito para quem, de fato, precisa do financiamento advindo do meio filantrópico, que são os projetos respondentes da pesquisa.


A PIPA é a materialização das soluções de diversas demandas e problemas relatados por várias gerações de fazedores e articuladores populares. É emocionante ter sido parte deste time de pesquisadores e ser uma das pessoas que ajudaram a “dar linha” nesta PIPA.

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